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5 de out. de 2022

sobre certificações e existir

Não sei se esse assunto é tratado pelo pessoal da frente LGBT+ do LinkedIn, mas tá ficando comum na minha rotina: problemas com processos para cursos, oficinas, workshops, o que for.

Primeiro começa nas inscrições:

NOME COMPLETO.

Okay, escrevo meu nome social, pois é assim que existo e me chamo.

Mas eu já sei de antemão que isso vai dar problema lá na frente na certificação - não tenho retificação de certidão de nascimento ou identidade, a burocracia me trava em muitos lugares, a grana para fazer o processo me falta, eu apenas quero fazer a bendita de inscrição e tentar ser uma profissional melhor!

Aí se há espaço na caixinha da inscrição eu copio e colo a menção sobre decreto nº 8.727, de 28 de abril de 2016 e o link para a legislação: [LINK DECRETO]

Passei por esse estágio, tá tudo bem? Acho que sim. Espero que sim.

Aí vem o campo SEXO...

Sério, minha gente, o que vocês querem com isso? Estatisticamente falando? Vocês vão mensurar quantas pessoas com genitais distintas irão participar? O tipo de gente com genital que comparece mais recebe algum bônus? Há alguma diferença de tratamento sobre as pessoas com genital y e z? E as pessoas com ambas? E com nenhuma? Já consideraram? 

Dica valiosa: não pergunte SEXO, perguntem GÊNERO, se forem fazer ações/estatísticas que tenham a ver com DIVERSIDADE E GÊNERO em suas atividades. se não houver nada disso, esse é um dado inútil e que faz a gente aqui do outro lado simplesmente desistir do processo de inscrição.

(Para quem não está habituado com essa questão, pesquise sobre DISFORIA, ajuda um pouco a entender o que acontece. Seria a mesma coisa se o tempo todo em todo lugar que você vai alguém te trata pelo nome errado e pronomes ao contrário, nada bom né? E embaraçoso demais!)

Aí até chegar ao final do formulário de inscrição, já está batendo diversas dúvidas se aquela atividade vai mesmo valer a pena para gente ter energia extra e aturar mais preconceito velado e falta de sensibilidade com algumas questões.

INSCRIÇÃO FEITA!!

Aí bate a ansiedade e a preocupação em como as pessoas vão interagir no curso. Quantas vezes já me trataram no masculino, apenas pelo fato de eu dizer que sou trans? Por que as pessoas acham que sair de uma binaridade (binário quer dizer 2 tipos de padrão) é automaticamente pular para o outro "gênero" predominante e cisnormativo?

Cês tem um manual aí que fizeram secretamente e não pediram pra ninguém de cá revisar?  

A ansiedade maior vem com a chegada do curso. E gente, eu só vejo eu nesses cursos como pessoa trans. Na área de Biblioteconomia eu não vejo meus pares! Não vejo as travestis, não vejo pessoas trans, é somente eu e é brutalmente constrangedor.

Porque eu entendo bem o motivo dessas pessoas não estarem nessas atividades ao meu lado: transfobia institucional.

Desde lá o ensino fundamental (E não dá garantia alguma se essas pessoas vão ter uma formação decente para ingressarem em uma faculdade) até na vida profissional, na qual vejo ZERO pessoas trans que conheço/esbarro/tenho ciência que estão na Biblioteconomia, nesses cursos. A gente não está nesses espaços.

Isso é sério.

Vocês estão sinalizando o tempo todo que eu não devo estar aqui. Que a minha existência como pessoa bibliotecária e outras pessoas como eu não devemos existir. Não devo trabalhar em bibliotecas. Não querem que eu contribua com a área. Não possibilitam outras pessoas como eu a estarem no curso de Biblioteconomia e serem pessoas bibliotecárias fabulosas e conscientes de seu lugar na sociedade.

O tempo todo tenho o lembrete de que o mercado de trabalho para pessoas trans é ou na esquina ou informalmente recebendo uma miséria e tendo que apelar para várias outras formas de sobrevivência fica não só na cara como me dá surras de consciência de classe diariamente.

No final do formulário de inscrição, sempre sinto a mesma sensação: eu não deveria estar aqui. Me inscrevendo para a atividade, tentando ser uma profissional capacitada, tentando acompanhar a máquina que mói a gente todos os dias.

Todos os dias.

Aí curso, oficina, workshop acaba, o que vem mais? Mais outra aflição: a CERTIFICAÇÃO.

SEMPRE dá errado.

Sempre tenho que respirar fundo e pedir por gentileza, presta atenção no formulário que preenchi e coloca o nome que requisitei? (Tá lá no Decreto, leiam! faz bem pro coração!) Por que insistem em perguntar sobre genitais dos outros e é comum para vocês fazerem essa maluquice discursiva, por quê é tão difícil entender qual nome eu uso?

É tão complicado assim ter um pouquinho decência e ética?

Estou desistindo de fazer cursos esse ano, essa é a lição que 2022 jogou na minha cara, inúmeras vezes de tentativas de inscrições e desistir no meio do caminho, de pensar duas vezes antes de me submeter a outra ansiedade empilhada e mais situações constrangedoras entre colegas de trabalho e de área, por não respeitarem o mínimo, como é que é mesmo no nosso Juramento de Bibliotecário? Ah sim, o tal de:

"Prometo tudo fazer para preservar o cunho liberal e humanista da profissão de Bibliotecário, fundamentado na liberdade de investigação científica e na dignidade da pessoa humana".

(Que deveria ser mudado urgentemente, se a mensagem não está sendo captada por quem trabalha na área, eu desisto.)

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